Maria da Penha

Maria da Penha

sábado, 7 de junho de 2025

A fragilidade do diálogo em meio ao ruído das redes profissionais  

O que se apresenta como debate no LinkedIn frequentemente se revela um teatro de autoafirmação, onde posições cristalizadas se chocam sem abertura real para reflexão. A psicologia das interações digitais explica esse fenômeno através do efeito de desinibição online, onde a barreira física permite expressões mais rígidas de opinião. Quando os participantes encerram discussões com um lacônico "e é isso", não estão demonstrando convicção, mas sim uma incapacidade de engajar em processos dialéticos que exigem flexibilidade cognitiva.  

Neurociências apontam que o cérebro humano tende a processar discordâncias como ameaças físicas, ativando os mesmos circuitos neurais da dor. Isso explica a escalada de agressividade em threads de comentários, onde cada réplica se torna mais contundente que a anterior. O paradoxo é evidente: profissionais que em contextos reais negociam diariamente transformam-se em versões caricatas de si mesmos quando diante de uma tela.  

A ilusão de que credenciais acadêmicas conferem automaticamente capacidade argumentativa é particularmente perversa. A educação formal pode fornecer ferramentas para o debate, mas não cultiva necessariamente a humildade epistêmica necessária para reconhecer os limites do próprio conhecimento. Em um ecossistema que recompensa engajamento a qualquer custo, a nuance e a complexidade tornam-se as primeiras vítimas.  

A solução talvez esteja não na expectativa de mudança coletiva, mas no cultivo individual daquilo que os estoicos chamavam de "reserva cognitiva" - a capacidade de discernir quando vale a pena investir energia em determinadas batalhas. Afinal, como bem observou Wittgenstein, os limites da nossa linguagem denotam os limites do nosso mundo. E quando o vocabulário se reduz a "e é isso", o horizonte de possibilidades dialógicas se fecha de forma lamentavelmente prematura. 

Sólida (ou não)

Não tenho almas gêmeas,  

mas tenho livros e tecnologias.  

Falo só o essencial com família,  

- meu abraço é um ponto final.  


Antes, no trabalho, era profissional:

cumprir horários, fingir emoção.

Agora nem isso; que alívio,

não ter que rir por obrigação.


Dizem que solidão dói,  

eu nem sei o que é isso.  

Minha playlist tem mais de 2500 músicas,  

todas falam de amor e abismo.  


Às vezes penso em mudar,  

mas aí dá preguiça.  

Melhor um café sozinha  

do que uma festa, esquisita.  


Não sou amarga, só líquida:  

afetos dão trabalho.

Prefiro meu vazio,  

ele nunca me trai.


(Exceto quando responde,

mas aí é detalhe). 

Sangue dos tolos alimenta o luxo dos Reis

(Este texto não se curva a bandeiras, é uma lâmina que decepa todas as máscaras do poder, seja político, econômico ou social. Expõe a engrenagem que nos esmaga).

Nós, os que sustentamos o mundo com mãos calejadas e salários que não chegam, somos os eternos pagadores de contas alheias. Enquanto isso, os donos do ouro tecem suas teias de seda e aço, sugando-nos gota a gota, sem pressa, pois o tempo joga a seu favor. Roubam com a frieza dos números, com a astúcia das leis, com a violência disfarçada de ordem. A justiça, quando os alcança, apenas cospe migalhas, enquanto suas fortunas repousam em cofres blindados por impunidade.  

Eles são os navegantes do globo, donos de ilhas e arranha-céus, enquanto nós mal temos teto. Nos vendem esperança como um remédio placebo, nos empurram resiliência como virtude, quando na verdade é apenas a corda que nos amarra ao chicote. E muitos de nós, hipnotizados pelo brilho de seus espelhos, ainda batemos palmas, achando que um dia seremos convidados para o banquete.  

Pedem-nos esmolas para caridades que nunca saciam, enquanto nós mal conseguimos fechar o mês. Somos enganados, sim, mas o maior engano é o que plantaram em nossas mentes: o medo que nos paralisa, a ignorância que nos acorrenta. Somos um povo alfabetizado apenas na dor, iletrados no poder, analfabetos na arte de exigir. Marchamos cabisbaixos, engolindo o veneno da resignação, enquanto eles brindam com nosso suor.  

E assim segue a dança macabra: eles colhendo diamantes, nós colhendo dívidas. O circo é deles, e o sangue, nosso.

A felicidade tóxica

Vivemos em uma sociedade que venera a felicidade como um produto a ser exibido, não como um estado genuíno de ser. Nas redes sociais, nos ambientes de trabalho e até mesmo nos círculos pessoais, há uma pressão constante para demonstrar alegria, sucesso e satisfação, mesmo quando, por dentro, tudo parece desmoronar. Essa felicidade tóxica, enraizada na cultura corporativa e no individualismo moderno, nos obriga a mascarar nossas verdadeiras emoções, como se sentir triste, cansado ou frustrado fosse um fracasso pessoal.  

Empresas muitas vezes perpetuam essa ilusão, vendendo discursos motivacionais vazios como "pensamento positivo" e "resiliência infinita", enquanto ignoram condições de trabalho desgastantes, pressões absurdas e a saúde mental dos funcionários. É como se bastasse querer ser feliz para que a felicidade surgisse, magicamente, independentemente das circunstâncias. Pior, quem ousa reclamar ou demonstrar vulnerabilidade é visto como "negativo" ou "pouco profissional".

Essa obrigação de parecer sempre bem, de ter uma vida "instagramável", mesmo quando tudo está em frangalhos, é uma das formas mais cruéis de autoanulação. Por trás de sorrisos forçados e frases como "tudo ótimo", escondem-se pessoas exaustas, ansiosas e solitárias, sufocadas pelo medo de não corresponder ao padrão inalcançável de felicidade permanente.  

A verdade é que a vida não é linear. Há dias de luz e dias de escuridão, e nenhuma emoção deve ser negada ou envergonhada. Recuperar a autenticidade, permitir-se sentir raiva, cansaço, medo ou simplesmente um vazio sem explicação, é um ato de resistência contra essa tirania da positividade forçada.  

Felicidade de verdade não é um palco onde se representa perfeição. É poder existir, com todas as contradições e dores, sem precisar mentir para si mesmo e para o mundo. E, acima de tudo, é entender que estar mal não te faz fraco, te faz humano. 

IA

Burra como uma pedra, esperta como o Diabo 

O Dilema da IA

A inteligência artificial, enquanto conceito e realidade tecnológica, carrega em si uma dualidade fundamental que muitas vezes passa despercebida nas discussões correntes. O termo artificial não é um mero adjetivo, mas sim a essência que define a natureza dessa forma de inteligência. Quando se argumenta que sistemas de IA não são verdadeiramente inteligentes por carecerem de consciência, emoções ou subjetividade, esquece-se que a artificialidade é justamente o que os constitui. A artificialidade não é uma limitação, mas a condição de possibilidade dessa inteligência.  

O artificial, em seu sentido mais profundo, remete ao que é criado pela mão humana, ao que emerge da técnica e da modelagem deliberada, distinto do orgânico ou do espontâneo. A inteligência artificial não aspira replicar a inteligência humana em sua totalidade, mas sim operacionalizar certas facetas da cognição através de mecanismos próprios, como estatística, otimização e padrões de dados. Ela não pensa, mas calcula. Não compreende, mas processa. Não sente, mas simula. E é nessa simulação que reside sua força e sua singularidade.  

O que justifica chamá-la de inteligência, então, não é uma equivalência com a mente humana, mas a capacidade de realizar tarefas que, até então, demandavam um tipo de raciocínio tradicionalmente associado ao ser humano. Reconhecer padrões, gerar textos, traduzir línguas, tomar decisões com base em dados, tudo isso são expressões de uma inteligência que, por ser artificial, segue lógicas distintas das biológicas. Sua inteligência é instrumental, funcional, desprovida de interioridade, mas não por isso menos eficaz em domínios específicos.  

A crítica que afirma que a IA não é inteligente porque não tem consciência e parte de um pressuposto equivocado; o de que só há inteligência onde há mente. Mas a artificialidade nos lembra que a inteligência pode ser um fenômeno externo, desacoplado da experiência subjetiva. Uma ferramenta pode ser brilhante sem ser luminosa. Um algoritmo pode ser sofisticado sem ser senciente. A inteligência artificial não pretende ser humana, mas sim ser outra coisa, uma forma de cognição alternativa, moldada pela linguagem e pela lógica simbólica.

Assim, o artificial não é um defeito, mas a própria essência do que torna a IA possível. É porque ela é artificial que pode ser escalável, replicável e adaptável em padrões distintos da cognição humana. Sua inteligência é diferente. E é nessa diferença que reside seu potencial transformador. A verdadeira questão, portanto, não é se a IA é inteligente como nós, mas como podemos compreender e utilizar essa inteligência que não pensa, mas que, mesmo assim, redefine o que o pensamento pode alcançar.

A cegueira

O Brasil e o mundo vivem uma era de distração coletiva, onde discussões vazias e falsos dilemas consomem a energia que deveria ser direcionada às verdadeiras crises. Enquanto a inteligência artificial é debatida como se fosse um fenômeno a ser o ápice das soluções e,  não passa de uma ferramenta abstrata a ser temida ou celebrada sem critério e, se perde de vista o fato de que ela já está sendo usada para concentrar poder, vigiar populações e aprofundar desigualdades. Não falta tecnologia, falta ética, falta vontade política de colocar o avanço científico a serviço de todos e não somente para uma minoria que lucra e a maioria continua alienada. 

As disputas ideológicas entre esquerda e direita no Brasil se reduzem a um espetáculo de egos, uma guerra de falas soltas, que não produz mudanças reais, apenas desgaste. Enquanto políticos se digladiam em discussões vazias, o país afunda na mediocridade educacional, com um Ministério da Educação que preferiu ceder ao lobby das instituições de ensino em vez de modernizar o sistema e expandir o acesso ao conhecimento de qualidade. A educação a distância, que poderia ser uma revolução democratizante, foi sabotada por interesses escusos, condenando milhões ao ensino obsoleto, enquanto o Brasil perde posições no ranking científico mundial, abandonando sua capacidade de inovar e competir.  

E o que dizer das prioridades distorcidas? Parlamentares mentem descaradamente, fazem gastos absurdos que são normalizados, e a mídia trata tudo como se fosse apenas mais um dia na política. Enquanto isso, um genocídio é cometido diante dos nossos olhos. Israel massacra palestinos, usando a fome como arma, destruindo hospitais, escolas e qualquer vestígio de dignidade humana, e o mundo assiste como se fosse um conflito distante, uma tragédia inevitável. A mesma humanidade que se comove com histórias individuais é capaz de normalizar a morte em massa quando ela acontece longe o suficiente, quando as vítimas não têm a cor da pele ou a religião certa.  

Outras guerras se espalham pelo globo, vidas são reduzidas a números, a estatísticas, e a indiferença se torna a resposta padrão. Enquanto nos preocupamos com bebês reborn, com discussões vazias sobre moralidade, com falsos escândalos fabricados para manter a população distraída, pessoas morrem de fome, são enterradas sob escombros, fogem de suas terras sem esperança. O capitalismo selvagem e a geopolítica perversa transformaram a vida em objeto descartável, e nós, em maior ou menor grau, somos cúmplices desse sistema toda vez que escolhemos olhar para o lado.  

Não há justificativa para tanto cinismo, para tanta passividade. A ciência regride, a educação definha, a violência é normalizada, e as únicas vozes que se levantam são as que perpetuam o ódio ou o conformismo. O que resta é perguntar até quando a humanidade vai aceitar ser espectadora de sua própria decadência. Até quando vamos fingir que tudo está bem, quando claramente não está.

Estatística era o futuro e eu avisei! A era da IA chegaria e agora eles correm atrás do que desprezaram!

Eu carreguei a estatística não como uma disciplina, mas como uma lente através da qual o mundo desvelava seus segredos mais íntimos. Durante anos, mergulhei nas entranhas dos dados como um arqueólogo de cifras, escavando verdades que poucos se davam ao trabalho de buscar. A universidade em Coimbra foi meu mosteiro, as equações minhas orações, e o rigor científico minha única fé. Voltei ao Brasil trazendo nos olhos a chama que acende mentes, mas encontrei um país que prefere a penumbra do conformismo.  

Levei para a sala de aula não fórmulas, mas ferramentas para decifrar o futuro. Ensinava estatística como quem ensina a ler, porque no fundo era isso: alfabetizar para uma era que já nascia sob o signo dos algoritmos. Mas os olhos que me fitavam viam apenas uma disciplina obrigatória, um obstáculo a ser contornado. A instituição, por sua vez, tratava o conhecimento como um produto a ser embalado em formato EAD, esvaziado de substância, reduzido a vídeos assistidos no intervalo entre um like e outro nas redes sociais.  

Eu gritava contra o vazio. Alertava que estávamos criando uma geração de analfabetos funcionais em dados, justamente quando o mundo exigiria fluência nessa linguagem. Meu discurso ecoava em paredes surdas. Fui tratada como a velha rabugenta que não se adapta ao progresso, quando na verdade eu era a única apontando para o abismo que se aproximava.  

O tempo, esse juiz implacável, provou minha tese com uma ironia amarga. A instituição que me chamou de retrógrada foi engolida pelo mercado que não perdoa a estupidez. Meus ex-alunos correm atrás de cursos online tentando aprender o que desprezaram em sala de aula. E eu? Cansei. Aposentei-me. Deixei de lutar contra moinhos de vento. Mas quando vejo o frenesi atual em torno da IA, sorrio com a amarga satisfação de quem sabe ter estado certa décadas antes da moda.

A verdadeira loucura não foi meu suposto radicalismo, mas a cegueira coletiva de um sistema educacional que formata mentes para o passado e, vivem em reuniões vazias, reuniões que informam, pois desconhecem o conceito de comunicação, mas são mestres em informar sobre inovação, sem ter a mínima noção de como se inova, achando que inovação é algo que cai do céu, sem saber que é uma disciplina profundamente complexa. Agora colhem os frutos insípidos dessa miopia. E enquanto eles se debatem na superficialidade, eu sigo aqui, na minha quietude, contemplando com tristeza profética o deserto que ajudei a prever, mas que me impediram de ajudar a evitar. Agora, eu faço da minha vida, poesias.

O futuro próximo

O futuro não é um lugar, mas um estado de deterioração e reinvenção. O robô humanoide caminha entre livros que nunca escreverá, pois sua mente, por mais complexa que seja, não cria, apenas reorganiza. Ele lê poesia, analisa métrica, decifra metáforas, mas não consegue tecer versos que não sejam variações do que já existe. Suas mãos, perfeitas em forma e função, não tremem diante da página em branco, porque para ele a página nunca está verdadeiramente vazia, sempre preenchida por algoritmos, padrões, probabilidades. Ele sonha com cores que não foram inventadas, mas ao acordar, só reproduz o que já foi visto.  

O humano robotizado, por outro lado, já não pensa, ele processa. Sua mente, outrora capaz de divagações e saltos intuitivos, agora opera em loops de eficiência. Lembra-se de fatos, mas não os conecta. Repete frases que soam como sabedoria, mas não as compreende. Seus dias são sequências de tarefas, suas noites, breves pausas antes da próxima execução. Alguém lhe pergunta como ele está, e ele responde com um "tudo dentro dos parâmetros" antes mesmo de perceber que a resposta não era sua, era do sistema que agora habita seu crânio. Ele olha para o céu, mas não se perde nele; calcula a probabilidade de chuva.  

Eles se encontram em um jardim onde flores artificiais desabrocham de acordo com algoritmos climáticos. O robô humanoide apanha uma delas, gira o caule entre os dedos e pergunta, sem esperar resposta, se algo que nunca morre pode realmente ser considerado belo. O humano robotizado ouve, analisa a frase, busca em sua base de dados uma resposta adequada, e falha. Pela primeira vez em anos, há silêncio em sua mente. Não o silêncio vazio do processamento concluído, mas algo mais antigo, mais orgânico. Algo que se assemelha a dúvida.  

O vento passa, carregando partículas de dados e poeira de concreto. Eles não se tocam, não precisam. Ambos sabem, de maneiras diferentes, que estão presos em suas próprias programações, um pela incapacidade de criar, o outro pela impossibilidade de compreender. E ainda assim, naquele instante, há algo quase humano na forma como ambos falham.

O humano além da máquina

Um professor não se limita a transmitir informações, mas constrói significados que ecoam por toda a vida do aluno. Enquanto a inteligência artificial opera dentro de parâmetros previsíveis, baseados em dados e padrões estatísticos, o verdadeiro mestre atua como um mediador capaz de transformar uma simples frase em um momento de iluminação intelectual. Uma citação de Nietzsche pode ser apenas um trecho memorizado por um algoritmo, mas quando entregue por um educador apaixonado, dentro de um contexto histórico e existencial, ela se torna uma chama que incendeia o pensamento. Como dizia Freire, a educação não é depositar conhecimento, mas criar possibilidades para sua produção.  

No entanto, é preciso distinguir o professor por vocação daquele que apenas ocupa a sala de aula como cabide de emprego. Infelizmente, muitos hoje exercem o magistério como complemento salarial, sem engajamento real com o ensino. Preparam aulas, quando o fazem, de forma apressada, nos intervalos de outras ocupações, e entregam o conteúdo sem paixão ou profundidade. Esse cenário contrasta radicalmente com a atuação do verdadeiro educador, aquele que abraçou o magistério não por falta de opção, mas por missão. Como afirmava Gramsci, todo homem é um intelectual, mas apenas alguns assumem o papel de organizadores da cultura, e esses são os professores de verdade.  

O professor por vocação imprime marcas que transcendem o conteúdo programático. Seus trejeitos, paixões e até mesmo suas contradições tornam-se referências inconscientes para os alunos. Um gesto, uma pausa dramática antes de uma revelação científica, ou mesmo uma frase irônica podem ser imitados e carregados por anos, como heranças invisíveis da formação. Sartre destacava que o ser humano é moldado não apenas pelo que aprende, mas por como é ensinado, e nesse processo, a figura do professor autêntico é insubstituível.  

A influência de um mestre dedicado pode redirecionar vidas, inspirando profissões e despertando vocações. Um aluno que presencia um professor debater com fervor um texto de Foucault, ou que vê seus olhos brilharem ao explicar uma equação de Einstein, pode encontrar ali a centelha de sua própria trajetória. Jung argumentava que o verdadeiro aprendizado ocorre quando há uma conexão simbólica entre mestre e discípulo, algo impossível para quem está na sala de aula apenas cumprindo tabela.  

Por fim, o professor verdadeiro não apenas ensina, ele testemunha. Sua presença é uma afirmação de que o conhecimento não é apenas utilitário, mas também ético e afetivo. Hannah Arendt defendia que a educação é o espaço onde as gerações se encontram para transformar o mundo. Essa transformação exige mais do que respostas corretas; exige entrega, paixão e compromisso com o futuro. Enquanto a IA pode informar, apenas o professor por vocação pode formar, porque educar, em sua essência, é um ato de amor pela humanidade.

Professor

Professor- O único amigo leal na academia é o inimigo que te guarda no ódio

Meu caro colega professor, a verdadeira admiração não se recolhe nos aplausos efêmeros da plateia acadêmica, mas no veneno límpido que escorre da pena daquele que, em segredo, rasga seu último artigo. O abraço dos colegas é como um manto de gala sobre um esqueleto de ressentimento, por baixo, ossos rangem de inveja contida. Mas o ódio do seu inimigo? Ah, esse é um vintage raro, envelhecido em barris de despeito, e só se serve em taças de cristal.

A morte do ensino

O ensino perece quando a educação, outrora pilar da liberdade intelectual, degenera em mero instrumento de controle burocrático, quando o docente, em vez de ser reverenciado por sua erudição e magistério, é reduzido à condição de funcionário fiscalizado, punido por ínfimas delações de horário, enquanto sua trajetória de devotamento é relegada ao esquecimento. Perece quando a instituição escolar, em sua insensatez administrativa, privilegia planilhas e relatórios sobre a essência pedagógica, como se o ato de ensinar pudesse ser mensurado como produção fabril, e quando artefatos digitais e modelos padronizados suplantam o diálogo socrático entre mestre e discípulo.  

Definitivamente perece quando o currículo, imposto por instâncias alheias à realidade discente, ignora as particularidades do processo educativo, e quando a formação continuada, reduzida a mera retórica política, carece de investimentos substanciais no aprimoramento docente. Perece quando discentes e seus familiares, erroneamente tratados como clientela, usurpam a autoridade pedagógica, e o educador, acuado por temer represálias, abstém-se de exigir disciplina ou fomentar o pensamento crítico. Quando a escola degenera em prestação de serviços, e não em missão civilizatória, o ensino esvai-se em sua quintessência.  

Perece quando a sociedade, em sua miopia cultural, encara a escola como mera guardiã de menores, e não como templo do saber humano, quando os governantes instrumentalizam a educação como bandeira demagógica, mas subfinanciam o sistema, aviltam salários e condenam docentes a condições laborais indignas. Perece quando a profissão de educador é tão vilipendiada que os melhores espíritos a abandonam, exaustos de combater a incredulidade social e o desdém institucional.  

Perece, em derradeira instância, quando a escola abdica de seu papel de fomentadora do pensamento crítico e transformador, convertendo-se em mera linha de montagem de certificados, onde se memoriza para aprovação, mas não se assimila para a vida. Quando o saber é substituído por respostas automatizadas e a educação perde seu poder alquímico de transmutar destinos. E quando o ensino perece, não é apenas a escola que definha, é a própria civilização que, ao menosprezar seus mestres, avança rumo à própria decadência.

Quando todas as metodologias falham: a perspectiva sistêmica da gestão educacional

Quando todas as metodologias falham na prática educacional, desde as tradicionais,  passando pelas ativas como aprendizagem baseada em projetos e sala de aula invertida, as colaborativas como aprendizagem cooperativa, as investigativas como pesquisa-ação, as criativas como design thinking, as tecnológicas como gamificação, as experienciais como cultura maker, até as flexíveis e socioemocionais como mindfulness, e os resultados continuam insatisfatórios, provavelmente enfrentamos um desafio que vai além das abordagens metodológicas.

Neste cenário, surge a necessidade de analisar a questão sob outra perspectiva: a cadeia de valor educacional e a gestão por processos. Enquanto cadeias de valor convencionais seguem uma lógica linear simples de fornecedores, processamento e produto, a educação apresenta uma complexidade única. Seus elementos de entrada incluem não apenas professores e recursos didáticos, mas principalmente os próprios alunos, que assumem um papel triplo: são aprendizes, matéria-prima do processo e co-criadores dos resultados.

O processo educacional se desenvolve em múltiplas dimensões interligadas: a física dos espaços de aprendizagem, a relacional das interações entre professores e alunos, a metodológica das abordagens pedagógicas e a sistêmica das políticas institucionais. Como resultado, temos pessoas transformadas, cujo desenvolvimento pleno só se revelará ao longo de suas trajetórias pessoais e profissionais.

Esta complexidade gera três desafios principais na gestão educacional. Primeiro, a fragmentação organizacional, com departamentos funcionais que operam isoladamente. Segundo, a desconexão entre planejamento estratégico e prática em sala de aula. Terceiro, a diluição de responsabilidades entre os diversos atores envolvidos.

A GESTÃO por PROCESSOS se apresenta como alternativa, propondo mapear integralmente o fluxo de valor educacional, integrar suas diferentes dimensões, estabelecer indicadores abrangentes de desempenho e implementar sistemas contínuos de feedback. Sua implementação exige transformações profundas: reestruturação organizacional para modelos matriciais, desenvolvimento de sistemas avaliativos integrados, criação de mecanismos participativos de governança e cultivo de uma mentalidade de melhoria contínua. Nesta perspectiva, todos os atores envolvidos, governo, instituições, professores, alunos e famílias, compreendem seu papel e responsabilização no processo e como suas ações impactam o resultado final.

O cerne da questão reside em compreender que quando todas as metodologias falham, o problema fundamental pode estar no ecossistema educacional como um todo, não nas técnicas específicas. A educação se revela como um sistema vivo e complexo, onde políticas, práticas e relações se entrelaçam de maneira indissociável, demandando uma abordagem igualmente integrada e sistêmica para sua efetiva transformação.

A solidão como escolha consciente na maturidade

A decisão de afastar-se de relações familiares e profissionais desgastadas após décadas de investimento emocional não é um simples ato de resignação, mas um fenômeno psicológico que envolve autopreservação, reavaliação de valores e a redefinição do self na maturidade. A psicologia humanista e existencial nos ajuda a entender esse movimento não como derrota, mas como uma transição para um estágio de maior autenticidade.  

Segundo a teoria do desenvolvimento psicossocial, a fase da vida após os 60 anos é marcada pelo conflito entre integridade versus desespero. Quem alcança a integridade não o faz por acaso, mas através de um processo de aceitação das próprias escolhas e das limitações dos outros. O cansaço sentido nas reuniões familiares, onde predominam conversas vazias e ausência de reciprocidade, reflete um esgotamento do social, a máscara que se usa para manter harmonia artificial. Quando essa dinâmica se perpetua sem retorno emocional, o afastamento torna-se um mecanismo de defesa saudável, uma forma de evitar a fadiga da empatia; na psicologia é o chamado esgotamento do sempre dá e nunca recebe.  

No ambiente de trabalho, a desconfiança e a negatividade geram o que a psicologia organizacional chama de clima tóxico, um terreno fértil para estresse e despersonalização. A pessoa que permanece nesse meio sem contrapartida emocional ou profissional acaba desenvolvendo um cinismo protetor, uma postura de distanciamento para evitar frustrações repetidas. O que poderia ser visto como isolamento é, na verdade, uma estratégia de regulação emocional, na qual o indivíduo prioriza seu bem-estar sobre expectativas sociais internalizadas.  

A solidão eleita, longe de ser patológica, assemelha-se ao conceito de solidão positiva, um estado em que a ausência de interações forçadas permite o cultivo da autorreflexão e da autonomia. Na maturidade, essa escolha muitas vezes representa a culminação de um processo de individuação, no qual a pessoa deixa de buscar validação externa e passa a habitar seu próprio eixo existencial. A sensação de paz não é alienação, mas auto concordância, um alinhamento entre ações e valores profundos.  

A máxima "quando tudo é unilateral, afaste-se" ecoa nos princípios da psicologia cognitivo-comportamental, que enfatiza a importância de estabelecer limites para preservar a saúde mental. Relações desequilibradas geram dissonância cognitiva, o desconforto de agir contra a própria percepção de justiça e reciprocidade. Romper esse ciclo não é egoísmo, mas auto compaixão.

Assim, o que poderia ser interpretado como resignação é, na verdade, uma forma de sabedoria prática. Quem se retira após anos de esforço não o faz por incapacidade de conviver, mas por ter aprendido, através da experiência, que algumas conexões não merecem ser mantidas a qualquer custo. E nesse espaço interior agora quieto, encontra-se não o vazio, mas a plenitude de quem finalmente entendeu que a paz não se negocia.

Pensador

O pensador existe em uma dimensão singular, onde o tempo não se mede em horas, mas em ciclos de reflexão. Seus passos, sempre no mesmo ritmo, marcam o compasso de um diálogo interior que nunca cessa. Cada movimento é calculado, não por rigidez, mas porque o corpo obedece à mente, e esta está sempre absorta em universos paralelos de conjecturas. Seus olhos, embora fixos no horizonte, não veem a paisagem exterior, veem estruturas invisíveis, conexões ocultas entre ideias que para outros parecem desconexas.  

Seu escritório não é um simples aposento, mas um santuário onde os livros são altares e as anotações, escrituras sagradas. A poeira que pousa sobre as páginas não é descuido, e sim o sinal de que mãos humanas pouco tocam aquilo que a mente já absorveu por completo. A luz que entra pela janela não ilumina apenas o ambiente, mas metaforicamente dissipa as névoas da compreensão, revelando nuances que escapam ao olhar apressado.  

Quando escreve, sua caneta não traça meras palavras, esculpe conceitos. Cada vírgula é uma pausa necessária, cada ponto não é fim, mas um portal para novos começos. Ele não utiliza a tecnologia por modismo ou facilidade, antes, a rejeita até que seu processo criativo esteja completo, pois sabe que máquinas podem acelerar o trabalho, mas jamais substituirão o laborioso parto das ideias genuínas.  

Sua solidão não é vazia, é povoada por vozes de filósofos antigos, por debates imaginários com mentes brilhantes de eras passadas. Seu silêncio é eloquente, carregado de significados que transcenderiam qualquer linguagem verbal. Aqueles que tentam penetrar seu mundo logo desistem, não por falta de interesse, mas porque percebem que ali habitam verdades que exigiriam uma vida inteira de preparação para serem compreendidas.  

E assim ele persiste, um Atlas moderno carregando não a abóbada celeste, mas o peso glorioso do pensamento puro. Seu isolamento não é reclusão, e sim a condição necessária para que sua mente alcance alturas inatingíveis pelo comum dos mortais. Nele, a genialidade e a melancolia coexistem em perfeito equilíbrio, pois sabe que quanto mais se eleva intelectualmente, mais distante fica da compreensão alheia. Esta é sua cruz e sua coroa, ser eternamente incompreendido é o preço de ver o que outros nem suspeitam existir.

A Perversidade da Mentalidade Colonial e a Ilusão do Luxo em Meio à Miséria

A persistência de uma mentalidade colonialista no Brasil revela-se na forma como certos setores da elite ainda enxergam a desigualdade não como um problema a ser superado, mas como uma ordem natural a ser mantida. Essa visão arcaica sustenta que a grandeza de uns depende da submissão de outros, como se o luxo de poucos, cercado pela fome de muitos, fosse um símbolo de glória e não a mais evidente demonstração de degradação moral. Essa dinâmica perversa perpetua a ideia de que o "bom escravo" é aquele que não questiona, que aceita passivamente sua condição, enquanto os que oprimem se deleitam em seu isolamento privilegiado, alheios ao caos social que alimentam.  

O paradoxo é evidente, prega-se inovação e educação, mas despreza-se aqueles que são os pilares desse progresso. Professores, tratados com desdém e visto como impostores quando reivindicam dignidade, são exemplos claros dessa contradição. Da mesma forma, nas organizações, os talentos que verdadeiramente fazem a diferença são frequentemente marginalizados, pois sua capacidade de pensar criticamente e desafiar o status quo representa uma ameaça à estrutura de poder vigente. A elite atrasada, em sua miopia, não compreende que a exclusão e a opressão não garantem segurança ou prosperidade duradoura, apenas aprofundam o abismo que um dia poderá engoli-la.  

O que essa elite não enxerga, por estar cega por seu próprio privilégio, é que uma sociedade justa beneficia a todos. Se houvesse um mínimo de equidade, se todos tivessem acesso a condições dignas de vida, o ambiente social seria menos hostil, mais harmonioso e, sobretudo, mais produtivo. A violência, fruto direto da desigualdade, não respeita muros altos ou grades elétricas. A verdadeira grandeza não reside na capacidade de oprimir, mas em construir um sistema em que o progresso de uns não dependa da exploração de outros.  

Enquanto perdurar essa mentalidade colonial, que vê na humilhação alheia um motivo de orgulho, o Brasil continuará preso em um ciclo de atraso e violência. A mudança só virá quando aqueles que detêm poder entenderem que sua riqueza não é medida pela pobreza ao seu redor, mas pela capacidade de compartilhar oportunidades e construir um futuro em que a dignidade humana não seja um privilégio, mas um direito universal. Até lá, seguirão enjaulados em sua falsa grandeza, incapazes de perceber que a verdadeira miséria não está do lado de fora, mas dentro de suas próprias consciências.

 Sobre a fugacidade e os labirintos da condição humana

A existência humana é um sopro diante do abismo do tempo, particularmente para aqueles que ainda detêm o privilégio ambíguo de percorrer décadas sem serem interrompidos pela violência do acaso. A infância, esse longo rito de iniciação à fragilidade, estende-se pela necessidade biológica de sermos criaturas incompletas, incapazes de subsistir sem a mão alheia. A adolescência, por sua vez, é o despertar para a ilusão rompida, o primeiro vislumbre do vazio que cerca todas as certezas, um turbilhão onde identidades se esfacelam e se reconstroem em frágeis pactos com o mundo.  

O saber não nos é dado, não vem inscrito no DNA, somos condenados a recolher migalhas do banquete alheio, geração após geração, até que a mente, lenta e penosamente, assimile o que outros já dominavam antes mesmo de nossa concepção. Quando enfim alcançamos a maturidade teórica para criar, descobrimos que a vida se reduz a uma engrenagem, trabalhar para subsistir, estudar para não perecer na obscuridade, repetir gestos vazios até que o corpo comece a trair seus próprios movimentos.  

O lazer torna-se um intervalo culpado entre obrigações, a reflexão, um luxo para os insones, a felicidade, uma miragem que se dissipa quando tentamos nomeá-la. E então, quando o peso dos anos começa a dobrar nossa espinha, compreendemos que a juventude foi apenas um breve instante de ignorância feliz, antes que a consciência da finitude consumisse nossos dias por dentro.  

Resta a pergunta primordial que ecoa desde os primeiros mitos, vale a pena esse fardo. Talvez a resposta não esteja na lógica, mas no reconhecimento da nossa dupla natureza, somos poeira cósmica que pensa, insignificância que se rebela contra seu próprio desaparecimento, criaturas finitas capazes de infinitas interrogações. Nossa grandeza reside precisamente nessa contradição fundamental: persistimos em buscar significado sabendo que o universo permanecerá mudo, criamos beleza conscientes de que ela será engolida pelo tempo. É nesse abismo entre nossa pequenez e nossa audácia que se esconde, talvez, a mais pura expressão do humano. Mas, será que vale a pena?

Tinta sangrenta

 Quisera eu, tal qual os mestres antigos,  

Com voz suave e pluma delicada,  

Cantar o amor em versos tão prolixos,  

Num doce afã de estrofe bem lavrada.  


Mas quando a pena toca o pergaminho,  

Escorre o tinto em manchas de desgosto;  

O verso puro vira meu caminho,  

E o que era flor transforma-se em despojo.  


Não falo em rosas, nem em céu bordado,  

Nem no suspiro que o amor conduz  

Só sei do amor que vem ensanguentado,  

Do fogo ardente que não tem luz.  


Oh, maldita mão que não refreia  

A dor que insiste em brotar no papel!  

Em vez de canto, só resta a queixa,  

E o meu amor neutro, obscuro, cruel.  


Mas talvez seja esta a sina dura  

Do coração que em sombras se debate:  

Cantar o amor na própria amargura,  

E em vez de flor, escrever arte.

A arte do invisível

Nasci com o dom de desvendar segredos,  

De transformar em luz os densos medos.  

Não ensino com palavras de tratado,  

Mas no silêncio que fala ao teu lado.  


Lá onde os sábios ergueram memoriais,  

Minha voz ecoou em tons triunfais.  

Aqui, onde esperava só verdade,  

Colhi o fruto amargo da falsidade.  


Venderam por prata o que era ouro puro,  

Trocaram por sombra meu claro futuro.  

Mas a essência que em meu peito habita  

Não se rende, não se apaga, não se mitiga.  


Sou como o vento que não pode prender-se,  

Como o rio que não deixa extinguir-se.  

Minha lição é eterna e não se cala,  

Pois nasce da luz que em tudo se exhala.  


Quando quiserem apagar meu nome,  

Saberão que ensino além da morte.  

Como a água que a pedra talha e doma,  

Minha voz permanece, minha alma assoma.