Maria da Penha

Maria da Penha

sábado, 24 de agosto de 2013

Promessa

Prometi! Então, não vá me deixar,
O resto são as queixas
Para suportar as madeixas
Que passaram em suas mãos.

Promessa feita
Não admite desleixo
Tem de cumpri-la com respeito
Só assim, cura o desfecho.

É promessa sob medida,
Que encerrará a paciente espera
Acender-se-ão as velas
E apagará a volatilidade da vida vivida.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Desejas-me

Desejas-me como quem deseja colher camélias em vasos de varanda
Como quem sonha em surfar na mais alta das ondas
Ou escalar a mais íngreme montanha.

Desejas-me como quem deseja chegar por teletransporte
Como quem conta com a sorte
Ou desconsidera a morte.

Desejas-me pela ilusão do querer
Pela fantasia do ego
Ou imanência e transcendência de poder.

Desejas-me sem as camélias
Cingido pela epopeia
Transmutado pelo épico.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Sem fim

O que você está fazendo aí parado em pé?
Para onde te levará essa fila?
Você tem certeza se ela terminará?
Sabe o que irá encontrar?
Sinto que você está bastante ansioso
Observando e esticando o pescoço
E é uma fila indiana
Parece mais uma romaria.
Suas mãos estão suadas?
Porque o seu corpo se move constantemente?
Será algo que você não poderá perder?
Existe uma hora marcada para chegar ao fim da fila?
Você está entorpecido por isso?
Tem de alcançar?
Você agora externa pela face certa raiva
Seu semblante mudou muito,
Foi pela certeza das vozes em sua mente,
Que disseram que não mais chegaria?
Agora você está agonizando na fila,
E olha para trás
Não existe mais ninguém?
A fila anda lentamente e você é o último da fila?
Não adianta se penalizar
Nada mais fará diferença,
Você se apossou da fila errada
Ela não tem fim nem começo
É uma fila em espiral, infinita.

Sua existência

Sua existência me conforta
Não importando saber se você,
Está rico ou pobre
Magro ou gordo
Com a aparência mais jovem ou envelhecida
Feliz ou infeliz
Acompanhado ou só
Viajando ou enclausurado
Comendo ou minguando
Nervoso ou apático
Com saudade ou desprezando
Drogado ou de cara
Orando ou resmungando
Sendo assim ou assado.
Assando.
O que mais me importa
É você existir,
Para que não desapareça
Este ser inconsequente
Que se tornou a minha fonte inspiradora
Dos meus momentos mais sublimes
Em que deslizo os meus dedos no teclado
Criando poesias.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Olhos nus, carmim

Onde vês o espiritual
Sou laica
Onde vês o uno
Sou dicotômica
Onde vês o passional
Observo consumação
Onde vês a interação
Enxergo recusa
Onde vês ódio
Percebo excitação
Onde vês o latente
Descortino o manifesto.
Veem os olhos antagônicos
A maneira que se vê,
É atração Shekespeariana
Dos olhos cinza e belos
Contra os meus olhos
Nus, carmim.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Telefone I

Estou concentrada e, num disparate, o susto
Um trim, trim, trim
É o telefone a tocar
Esvazia-se momentaneamente o meu cérebro
Inusitadamente, inconscientemente
Como um afogamento é a sensação
Raiva, ódio, sofrimento
Mas tenho que falar
Alô, Oi, Sim, sei lá o quê
Do outro lado, um “como vai você”?
Então reflito, falar
Como vou? Nada mudou
Vou indo, sem pensar
Num presente indecente
Com um muro a minha frente
Mas o que interessa, como vou?
Vou a pé, de trem, de ónibus
Vou como bem me apetecer
Como posso também, não ir
Vou bem, vou mal
Que diferença faz
Que farás por mim
Independente da resposta que receber?
Mas depois que me deixou por um momento, no vazio
Minhas respostas se tornam monossilábicas
Como tu queres ser perfeito
Com seu tosco telefonema?
Atrapalhando o meu estado criativo
Minha concentração perfeita
Meu invólucro intransponível
Quebrado por um telefonema inútil.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Leitura oca

Não leias mais as escondidas o que escrevo,
Não mostres mais a tua burrice, que já conheço,
Ler sem saber interpretar.
Não, nunca fora amigo e muito menos amante,
Tu és um espaço vazio no horizonte
Que Deus se esqueceu de completar.

Vaidade

Beber para ter coragem de gritar
O grito dos indecentes
Da inconsequência
Da justificação que não convence.

Viajar para fugir da própria verdade
A verdade que está enraizada
Que acompanha em toda a caminhada
E da redoma não sairá.

Pássaro negro camuflado de mil cores
Para manter os milhares de amores,
Mas a chuva cairá
E as cores irão desbotar.

Manter um tapete vermelho estendido
Caminhar sobre ele desmilinguido
Com a bebida, as viagens e as cores,
Que causam dissabores.

Que presunção mal fundada
De quem mantém ostentação
Para merecer admiração
De uma qualidade do que é vão. 

Caiçara

Caiçara, paira na praia,
Vagabundo sem toalha
Sem préstimos para a gandaia
Malandro que gosta de rabo de saia.

Caiçara, em sua estupidez de canalha,
Vive na orla ordinária
Tolamente selvagem
Não se embaraça.

Caiçara, pouco polido,
Medíocre, sem nada de extraordinário,
Vivendo do conto do vigário,
Inteiramente grosseiro e mal-educado.

Caiçara, mil quilos a mais sobre a terra,
Que pesa pela sua ignorância
Dividindo-a sem elegância,
Humanidade humilhada pela sua hipocrisia.

Caiçara, veste a sua carapuça,
Saia de mansinho
Bem devagarzinho
Assim, não nos atrapalha.

Amigo

Amigo, o que queres de mim?
Todas as melhores pedras incrustadas no marfim?
Todas as minhas virtudes?
Quantas cobranças que me faz!
Pergunto ainda:
O que tens para mim?
Somente as loucuras dos seus lamentos?
Nunca esquece as minhas conjecturas?
Mas as suas, nunca haverás de lembrar?
Amigo, esqueço sempre as nossas desavenças,
Perdoo sempre, mas voltas a lesar.
Em cada mau trato, uma pedra se desprende do marfim,
A joia vai perdendo o seu valor
Ficando somente uma nuance
De uma amizade hesitante.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Da neurose à psicose

Tens a neurose furtiva,
Vives alucinado e em delírios.
Na tua neura temos diálogos,
Na tua psicose, espasmos.
Nos diálogos rouba-me a distinção,
Sente-te sobranceiro
Denodado em seu valor.
Quando entras na alma das sombras
Veste-te de altivez,
Dos teus delírios à empáfia
Rebusca com apreensão
Com esmero excessivo
À sensação que precede o ataque,
Que já na crise aflitiva
Suga-me toda a energia,
Abrindo sulcos na terra.
Vejo pelos profundos rastros
Deslizando abaixo
O primor que fostes um dia.
Entro em profundo desassossego
De ver-te neste estágio iminente
Indo ao encontro do desenlace fatal.
Sinto-me rigorosamente impotente
De controlar os teus propósitos
Desde logo, subsistentes.

Tecnologias

Não fiquem irritados com as tecnologias
Elas não nos dão bola
Elas não se preocupam com nós.
Temos toda a liberdade em usá-las
Mas elas não nos pedem isso.
Elas podem nos dar acalantos
Mas também decepções
Nós a controlamos
Elas, não.

sábado, 3 de agosto de 2013

Agonia

O fardo que carregas agora
Não é nada perante o que está por vir.
Estarás na sofrível lida para tirar a nódoa
Do esfregaço criado pelo vinho derramado.

O que desejas que eu te dê agora?
O esquecimento, a dor em que agonizei...
A saudade desgarrada...
Não, dar-te-ei a verdade mais temida.

Dou-te a liberdade e o que ela oferece,
A natureza rústica
O cheiro das flores do agreste
A esperança mórbida da vida terrestre.

Tens tudo nas mãos para delinear a tua história
E quem sabe achar a mais nobre pepita
Que rola nas águas esquecidas.

E o que a mais te dou para te consolares?
O bálsamo das palavras agastadas
Que com elas curei as minhas feridas.