Maria da Penha

Maria da Penha

quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Entre o brilho e a sombra: O paradigma da convivência com mentes geniais e almas isoladas

Vivemos em uma era que exalta o intelecto e a busca pelo conhecimento, mas nem todo brilho intelectual resulta em uma luz que aquece o convívio humano. Há uma parcela de indivíduos cuja inteligência e formação nas mais conceituadas universidades do mundo conferem-lhes um potencial impressionante. Contudo, paradoxalmente, essas mentes brilhantes frequentemente são envoltas em uma cortina de distanciamento emocional e social, o que torna a convivência com elas um desafio tão intenso quanto suas capacidades cognitivas.

Essas pessoas habitam um espaço psicológico peculiar, onde o mundo exterior parece existir apenas como um pano de fundo para seus interesses e reflexões internas. Imersas em si mesmas, tendem a rejeitar as convenções da sociabilidade, preferindo interações superficiais e pontuais ou, em muitos casos, nenhuma interação. Essa postura, por vezes, dá a impressão de que estão desligadas do fluxo da vida cotidiana, como se o que acontece ao seu redor fosse irrelevante ou indigno de sua atenção.

Não menos desconcertante é sua dependência emocional e financeira de terceiros, geralmente familiares próximos. Apesar de necessitarem desse suporte, demonstram um desapego que beira a indiferença. Esse comportamento sugere não uma ingratidão consciente, mas uma espécie de cegueira emocional para a dedicação dos outros. O peso dessa relação recai, quase sempre, sobre os ombros de quem oferece apoio, que se vê frustrado pela ausência de reciprocidade ou de um gesto simples de reconhecimento.

Ademais, essas pessoas revelam um individualismo exacerbado, onde suas necessidades e interesses são priorizados acima de qualquer vínculo ou responsabilidade coletiva. Elas capturam, com uma sensibilidade ímpar, a beleza do mundo natural, mas raramente voltam esse olhar atento para as dinâmicas humanas ao seu redor. Seu silêncio sobre si mesmas, longe de ser um sinal de humildade, muitas vezes é um reflexo de um ego centrado que deseja ser reconhecido, mas não compreendido.

Conviver com essas almas é enfrentar um constante paradoxo: elas atraem e repelem, encantam pela genialidade, mas frustram pela ausência de empatia. Exigem paciência, mas oferecem pouco em troca. Estabelecem barreiras invisíveis que, embora possam proteger sua complexidade interna, isolam-nas do calor humano e da possibilidade de vínculos genuínos.

No fundo, sua visão do mundo é tão singular quanto solitária. Elas não caminham em harmonia com os outros, mas em trilhas isoladas, onde o próprio reflexo é companhia suficiente. Entender essas pessoas pode exigir uma generosidade quase sobre-humana, mas talvez o maior dilema seja decidir até que ponto vale a pena insistir em penetrar em universos que, por escolha ou incapacidade, permanecem hermeticamente fechados.

Melhorar o relacionamento com pessoas de comportamento antissocial e individualista exige paciência, empatia e respeito mútuo. Algumas estratégias incluem:

  1. Compreender e aceitar: Respeite sua visão de mundo e evite julgamentos.
  2. Respeitar o espaço: Dê-lhes autonomia, mas esteja disponível quando precisarem.
  3. Estimular reciprocidade: Valorize pequenos gestos e encoraje o reconhecimento.
  4. Focar em interesses comuns: Use seus hobbies ou paixões como ponto de conexão.
  5. Estabelecer limites: Seja claro sobre suas necessidades e expectativas.
  6. Reforçar positivamente: Elogie atitudes que promovam interação e cuidado.
  7. Incentivar autonomia: Apoie passos rumo à independência financeira e emocional.

Por fim, aceite que mudanças profundas dependem delas mesmas e cuide de manter seu próprio bem-estar durante esse processo.

Cálice Parto da Terra

Queimada de pólvora, a história rasteja,

uma serpente de fome engolindo o sol.

Na cidade das promessas quebradas,

o berço do homem é o túmulo de outro.

 

Catedrais de vidro erguem-se para os deuses

do ouro, enquanto ao rés do chão,

as crianças mastigam o vazio,

alimentadas pela poeira das guerras invisíveis.

 

Ah, a guerra — essa mãe mutilada,

parindo filhos para cova antes do choro.

O sangue escorre em línguas ancestrais,

enquanto o mercado ri e fatura.

 

E o gênero?

É lâmina que corta o grito na garganta,

é gaiola dourada para as asas de aço.

"Mulher é flor", dizem os homens,

mas esquecem das raízes em solo de chumbo.

As flores também sangram,

também quebram quando pisadas.

 

A desigualdade é um banquete cruel,

com pratos cheios para poucos,

e migalhas disputadas por dentes famintos.

Os corpos das periferias são palcos,

e o espetáculo é sempre o mesmo:

miséria encenada sob holofotes de desprezo.

 

Não quero versos suaves.

Quero arrancar a carne desse sistema,

gritar contra os palácios de indiferença.

Que os poetas gentis me perdoem,

mas aqui a poesia não é flor,

é faca,

é fogo,

é punho cerrado no coração do mundo.



terça-feira, 29 de outubro de 2024

Sobra da falta

Chucro é o passo, tropeço no pó,
morto de sonhos, pobre de intento;
roto na roupa, no peito o nó,
sobra só falta, vento e lamento.

Poder se exibe, veste de brilho,
mas fome espreita na sombra escura;
liberdade escapa, leve, andarilho,
nas mãos dos rotos, sombra e fissura.

E o que sobra da falta, em peito cansado,
é o pouco que arde, lume apagado,
povo sem rumo, olhar sem guarida,
falta que sobra, eco sem vida.



quarta-feira, 23 de outubro de 2024

O Silêncio que esconde


Há perigo no silêncio,
na fala que nunca cresce,
no olhar que se acomoda,
no sim que nunca desce.

A mansidão disfarça o vago,
um abismo oculto e frio,
onde a voz não faz eco
e o coração é vazio.

Aceitar o tudo sem luta,
sem sequer respirar o não,
é como caminhar nas sombras
sem saber a direção.

Quem nunca levanta a voz
nem questiona o caminho,
talvez se perca na ausência
ou se esvazie sozinho.

Medo me dá essa calma,
essa paz sem fundação,
pois no fundo do silêncio
mora a sombra da omissão.


Desencanto lúcido com as máscaras da vida

Sou da lógica, dos números frios,

Onde o caos se ordena em linhas retas.

Racional, calculo cada passo,

Enquanto o mundo se perde em máscaras de festa.


Não me entrego à fé que não vê,

Agnóstica, questiono o que não se pode provar.

Vejo as mãos erguidas ao vazio,

Gritando por sentido onde só há escuridão.


Antissocial, observo de longe,

A plateia de sorrisos ensaiados.

São vidas fingidas, papéis bem decorados,

Em um teatro de mentiras que já não me enganam.


Revolta-me a farsa que aceitam sem pensar,

O conforto da ilusão, o medo de duvidar.

Eu não me calo, nem me entrego à mentira,

Minha verdade é fria, mas ao menos é minha.

domingo, 20 de outubro de 2024

Professor

Um bom professor, em sua essência mais elevada, é aquele que possui a habilidade rara de navegar por temas complexos e, com elegância intelectual, consegue torná-los acessíveis e compreensíveis. Simplificar o complexo não é um ato de superficialidade, mas sim um processo de decodificação profundo. Isso exige, antes de tudo, uma compreensão detalhada das nuances do conhecimento, pois apenas quem domina verdadeiramente o conteúdo consegue explicá-lo de maneira clara e inteligível ao aprendiz.

Esse professor não banaliza o saber, nem o priva de sua riqueza, mas o apresenta de forma clara, sem perder suas múltiplas camadas de significado. Tal habilidade requer não só conhecimento teórico, mas também sensibilidade pedagógica, para identificar as barreiras que dificultam o aprendizado e, a partir disso, construir pontes que levem o aluno ao entendimento profundo.

Ensinar, quando feito com eficácia, não se trata apenas de transmitir informações, mas de criar condições para que o outro possa compreender o que, à primeira vista, parecia indecifrável. Assim, o professor é, em última análise, um mediador entre o complexo e o compreensível, um tradutor que transforma realidades epistemológicas em linguagem acessível ao cotidiano do aluno.

Nessa jornada, o bom professor ilumina os caminhos da aprendizagem, não oferecendo respostas prontas, mas incentivando o aluno a fazer suas próprias perguntas e a construir o conhecimento de maneira autônoma. É nessa interação entre a complexidade do conteúdo e a clareza da explicação que reside a verdadeira maestria docente.

Minha ética

 Minha ética se baseia em convicções fortes, indo além de simplesmente seguir regras ou buscar aprovação. Eu ajo não por pressão, mas porque acredito nos princípios que guiam minhas ações. Max Weber distingue entre a ética da convicção e a ética da responsabilidade, e eu me identifico com a primeira: sigo meus valores, sem abrir mão do que considero certo, independente das consequências.

Sei que essa profundidade ética não é captada em interações superficiais. Muitas pessoas formam suas impressões a partir de conversas rápidas ou momentos breves, que não revelam minha verdadeira essência. Para entender quem sou de fato, é preciso um diálogo mais profundo, onde minhas convicções e princípios possam aparecer. Não dá para me conhecer bem apenas com interações rápidas.

Minha postura ética, como a de Kant, está ligada ao dever moral e à autonomia. Para ele, as ações têm valor moral quando feitas por dever, e não por interesse. Do mesmo modo, minhas ações são guiadas por algo maior, que muitas vezes não é visível para quem me conhece apenas de forma superficial.

Entendo que, para alguém me conhecer de verdade, é necessário mais do que convivência. É preciso um diálogo verdadeiro, onde posso mostrar minhas crenças e valores. Só assim minha essência pode ser realmente compreendida.